quarta-feira, 23 de abril de 2008

A ESPERANÇA DE LAURA

A esperança ressuscitava-se sempre. Era um desses sentimentos surpreendentes em Laura. As coisas por insolucionáveis que fossem, aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo, resolviam-se.
Sua vida tinha cara de provação. Resolveu se achar bonita, porque há algum tempo lembrara-se que o fora. Foi ao cabeleireiro retocar a raiz do cabelo; depilou-se; resolveu perfumar-se com a melhor colônia e sair depois para comprar frutas usando a roupa adequada – mas a melhor que havia no guarda-roupa. Precisava sentir-se assim para si mesma...
Respirou fundo e notava com admiração que a vida podia ser imensa.
Havia sido entregue a uma paixão sem limites. Deixou-se cegar, ao extremo, das coisas mais óbvias. Sua janela direta com o mundo tinha o nome de Sérgio O que agradaria sua alma, necessariamente permitiria o mesmo a Sérgio. Sérgio era sua mais intensa felicidade. O êxtase mais secreto tinha o nome de Sérgio. Ele construía sua existência...
Em menos de um ano de namoro, resolveram morar juntos. Foi gostando de se tornar dependente de alguém, foi fácil colocar nele o seu posto de porto-seguro mais próximo. Ele talvez tivesse uma segurança em si mesmo mais aflorada do que a dela. Dependia dele para escolher uma roupa, porque qualquer olhar reprovável a faria mudar de idéia mesmo... No fundo, ela sempre quis agradá-lo; pois era a felicidade dele que a fazia ficar bem...

Com dois anos de namoro, casaram-se na igreja e de papel passado. Em menos de seis meses depois, teve a primeira prova concreta de uma traição. Calava para si o segredo e se perguntava onde errara.
Começaram a se amar com menos fervor, já não se tratavam como antes... Ele já não dormia todas as noites em casa, arranjava uma desculpa qualquer ou sequer avisava...
Meses de coma do espírito.

E um dia assim, eis que está no jardim, entregue ao desprezo que se achava estar, surpreende-se com o jardineiro:

- A senhora só parece ficar mais bonita com o passar do tempo! – riu-se e foi embora.
Ela sabia que aquele elogio era sincero. Aquele simples gesto a fazia perceber que conseguia ser notada e não simplesmente notar os outros.
A esperança lhe reacendeu. Parece que tinha se esquecido de como era ser feliz. Viu-se nesse tempo... Caminhos melhores começavam a se desenhar como saídas exatas.

Calor de fim de manhã. Admirou-se do rosto maquilado, sentia-se interessante! Riu, gostou do sorriso. Colocou os óculos escuros, saiu à rua e pensou seriamente em arranjar um amante.

Hérlon Fernandes Gomes, Brejo Santo - CE, 23 de abril de 2008.
P.S.: Ao meu amigo-irmão Ivan Frank, que tem a cara e o espírito da esperança.

3 comentários:

  1. "A esperança ressuscitava-se sempre. Era um desses sentimentos surpreendentes em Laura..." Poderia dizer q era de Nelson e acreditaria, mas, ao longo perceb-se o estilo doa artista de Brejo santo, Herlon, se mostra em processo de amadurecimento, uns podem ver como conto, outros,um resumo de um romace instigante e cartaático p/ inúmeras "Lauras" brasileiras, de alma Macabéia, ñ metroplitanamente provinciana, (seu espaço é atemporal) mas sim!Provincianamente apaixonada.

    David farias

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  2. Tio Hérlon, vendo os comentários dos seus amigos fico até encabulada pra comentar sobre suas relíquias, pela simplicidade do meu vocabulário. Mas não poderia deixar passar em branco não é mesmo? Adorei esse texto de Laura, aliás adoro todas as suas obras. Sua eterna leitora e fã.

    Vitória Louise

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  3. Rejuvenescedor.
    Gosto desse gostinho de recomeço.
    Sempre podemos melhorar.
    Sermos melhores.
    Adoro.
    Lindo como de costume.

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