terça-feira, 28 de abril de 2009

PLA-CATA-TÔNICO

Não é tão simples assim se livrar de um desejo que nos tenta, que nos quer mudar a cor do tempo. Não é simples porque desejos assim prometem o êxtase da felicidade. Era assim que ele se lembrava daquela mulher, que tinha como enorme defeito estar casada com seu melhor amigo.

Era uma paixão platônica de anos, guardada no seu âmago como o mais perigoso segredo. Conseguiu se envolver em outros amores, mas a presença de Estela atormentava-o. Gostava de pronunciar seu nome em segredo, sentia-se um adolescente. Os olhos dela lhe diziam de uma cumplicidade de desejo, afogavam-se cheios de luxúria por três segundos que fossem...

Certa noite o amigo insistiu que tirasse Estela para dançar enquanto pegava uma bebida... Pensou em inventar uma desculpa qualquer para recusar o convite... Mas seria a primeira vez de uma maior proximidade de ambos. E que proximidade...

Ele ainda tem guardada a exata sensação da frieza das mãos dela e a gostosura que foi poder sentir sua silhueta roçar mais firmemente a superfície da mão... Corações aos pulos. Nenhuma palavra. De repente se olharam fixamente, muito além dos três segundos habituais, e aquele momento queimou os dois.

Nesse silêncio, disseram tanto de cada um... Ele enxergou o mesmo delírio de desejo e culpa que via em si, mas o arrepio de deleite que lhe avolumava as formas entorpeceu-o mais e mais. A música parou de tocar, era preciso rever o amigo.

— Não sabia que você dançava tão bem, Roberto!

— Danço? – retrucou meio sem jeito... Espero surpreendê-lo em mais oportunidades como esta, amigo!

Riram-se e brindaram.


Hérlon Fernandes Gomes

28 de abril de 2009

quinta-feira, 2 de abril de 2009

MINHA PAIXÃO PELOS VINIS - I



  Sempre fui apaixonado por discos de vinil, talvez pelo mundo paralelo do qual os mesmos me cobriam. Eu me achava precoce entre as outras crianças e já gostava de timidamente observar  como as pessoas sentem o mundo. Escutar os antigos boleros que tocavam na eletrola da casa de meus avós era um programa que eu curtia em segredo.
  A casa vivia em música. Aquela eletrola fez a alegria de muita gente. 
 O acervo era volumoso e variado. Com o tempo fui aprendendo a distinguir os discos. Os mais antigos, bem pesados e quebradiços, rodavam em 78 rotações por minuto, bem rapidamente se compararmos com os Long-plays mais recentes de apenas 33 e 1/3 RPMs. Aqueles conseguem se perpetuar no tempo, pois as gravações são bem espaçadas, cada lado armazena apenas uma música -  se não se espatifam no chão, já que são de goma-laca - frágeis como o vidro. Por esses eu tenho paixão...   Infelizmente apenas alguns restaram dos muitos que lá havia. Vez por outra tenho a sorte de barganhá-los em sebos espalhados por esse Brasil de meu Deus... São presentes que satisfazem uma compulsão da minha alma. Desterram o charme de um tempo esquecido, quando os sentimentos pareciam valer mais. Ouvi muitos boleros de Dalva de Oliveira, Isaura Garcia, Emilinha Borba, Ângela Maria. Eles marcaram e povoaram inúmeras atmosferas apaixonadas... 
  Quero postar para vocês um vídeo de minha eletrola  ISABELA VI - A VOZ DE OURO rodando um 78RPM de Eladyr Porto:  o tango QUERO VER-TE UMA VEZ MAIS. Música típica dos anos 50.


P.S.: Para mãe, as tias Fátima, Naíde, Neta, Tantor, Lurde e Maria (as que repartem comigo lembranças desse tempo de velha guarda). Para vovó Hozana, na sua lucidez de 91 anos. Com amor.