terça-feira, 28 de dezembro de 2010

SAMBA DE UMA NOTA SÓ


Por ora, eu queria vencer o sono da madugada e poder encontrar na claridade esse objeto obscuro, que pode estar bem óbvio diante de nós e, no entanto, carrega o mimetismo do camaleão.

Queria deitar-me sobre a cama e sentir o sereno frio da noite pousar-me a pele nua para depois, sorrateiramente, arrepiar-me coberto por beijos quentes e encantar-me dessa preguiça louca de depois do amor.

Depois de tanto sonhos, de tantas vontades, concluo que deveria domar essas minhas inquietações, acostumar-me à deriva misteriosa desse barco e esperar, esperar, esperar...
Esperar que os segundos tragam um novo verniz, um novo aconchego, um riso mais perene; porque, afinal, estamos sempre na expectativa pelo inédido, por emoções que nos contem outras nuances e não façam a vida parecer um samba de uma nota só.

Hérlon Fernandes Gomes

Brejo Santo - CE, 27 de outubro de 2010.

(Dias em casa, consumindo a saudade do meu Cariri.)

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

INSATISFAÇÃO


INSATISFAÇÃO

Meu lamento tem a cor da saudade,

O batuque oco da ausência,

O gosto insosso de um vazio  de convento.

O sono tenta fazer-me esquecer dessas necessidades da alma,

Tenta aliviar o que nenhum sonho compensaria...

Quando o dia amanhece, a luz do sol me extasia,

Embora não me garanta o conforto inédito pelo qual almejo,

Não me espante as aranhas que me enchem de teias de abandono...

Deus me tem feito esperar no Seu enigmático silêncio,

De estradas longas por destinos adiados de promessas valiosas.

***

Vou em frente:

Gostando da sede que se evapora na chuva surpresa,

Encantado de aromas inebriantes como os das flores de camará,

Adormecendo ao som da cachoeira que me revigora no arrebatamento de cansaço...

Há um arco-íris a deslumbrar-me.

(Onde está o pote de ouro?)


Hérlon Fernandes Gomes


12 de dezembro de 2010. (Madrugada)

Guajará-Mirim, Rondônia.


P.S.: Este poema saiu depois de imenso tempo sem saber sobre o que escrever... Estou voltando ao Ceará passar uns dias. Espero que a alma do Cariri me renda uma perene inspiração. Saudades de retornar aqui.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

TRISTESSE – MELANCOLIE – PALE BLUE EYES

Teus olhos azuis me servem de mote nesta madrugada desacompanhada. Não se trata de um drama barato. Nada soa como um bolero condoído de amor. A sensação de agora me inunda como o oceano insondável dos teus olhos claros costumava me saciar, a me dizerem, a me decifrarem segredos que nenhuma língua atribuiria uma comunicação similar. Permaneço em transe perante somente a lembrança deles, desterrados numa canção, no acaso de um bar, num lugar distante... Embora essa distância não seja nem de perto suficiente para afogar a recordação desses dois abismos que ainda me perseguem...

Fumei todos os cigarros que pude. Nenhum me deu o alívio da tua presença enigmática. Nenhum teve na brasa fugaz a luminosidade eterna dos teus faróis. Permaneci à deriva, angustiado, triste... Anônimo solitário.

Sim, são todos estranhos.

Não há mais a cumplicidade insondável do teu mistério; não há mais profundezas pelas quais eu me arrisque e ainda assim me sinta abrigado. Agora é só silêncio; agora é apenas desejo.; agora é essa sensação de fome insaciável.

No quarto escuro, meus olhos procuram tua luz.

***

“...linger on your pale blue eyes...”


Hérlon Fernandes Gomes, 29 de outubro de 2010.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

EU CANTO COMO O REI DAVI


Às vezes alguma angústia tenta me inundar os planos, com medos desconhecidos...

Meu Deus me guia nessa travessia nebulosa e me eleva pontes nos desfiladeiros. Quando me canso diante de montanhas intransponíveis, Ele me faz nascer asas e prepara fontes de água fresca para aplacarem minha sede. Se amarguro a saudade de casa, à noite ele me consola com sonhos sublimes, em que minha mãe me abraça com um sorriso santo e meu pai assobia para o sabiá na gaiola.

O meu Senhor me inspira hinos iguais aos do rei Davi, porque eu me envaideço por servi-Lo sem nunca me sentir um escravo; pois com Ele sou sempre nobre. Ele é a minha rocha por sobre onde edifico meus ideais. Se entrego meus planos a Ele, meu amanhã é certeza de promessas cumpridas – porque o Senhor Meu Deus é fiel.

Minha alma é um eterno amanhecer. Deus é essa luz perene a me guiar, a aniquilar qualquer treva covarde, a murchar a inveja mesquinha do irmão pobre de espírito. O Senhor é pastor diligente; recobra-me quando me desvio; dá-me o exato peso de cada lágrima derramada.

Meu Senhor é o Amor Maior. Ele ofereceu Seu único filho como cordeiro e permitiu que o Destino se cumprisse onde os homens não o reconhecessem como irmão. Nessa dor eu descubro Tua santidade, ó Pai. Nessa dor eu peço graças em nome do irmão Cristo Jesus para que me proteja com Suas bênçãos, para que salve a humanidade.

Amém.


Hérlon Fernandes Gomes


25 de outubro de 2010.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

EU, CARTOLA, AURORA E A PRIMAVERA ou UM ENSAIO SOBRE A ESPERANÇA


Acordei mais cedo do que o de costume. Cinco e meia da manhã. Aqui no Norte, o sol demora a nascer. Escuridão fechada, frio seco. Levantei-me para preparar um café que me ajudasse a manter o despertar. Olhos abertos de lunático, perscrutando o infinito íntimo... Eu e essa mania de me sondar infindavelmente... Faço uma oração secreta e poderosa que minha avó nonagenária me ensinou. Mensuro diariamente tanta saudade que me parece explodir a alma, a calma, o prumo das coisas. Ligo baixinho o som para não incomodar os vizinhos. Cartola canta Preciso me encontrar. Eu, diante da porta aberta do quintal, miro as estrelas vacilantes que ainda se aventuram em insistir na noite. Sinto nelas uma coisa que está em mim, que eu não saberia explicar com a linguagem verbal que aprendi... Elas se apagam; mas há certeza de que amanhã estejam a luzir ali, embora nem sempre as mire.



Decido sair. O sol agora perfila as nuvens com seus lilases de aurora. Essa paisagem é meramente coadjuvante, pois ainda continuo a me empreender nos meus pensamentos. Cartola continua nos meus ouvidos, como um dejá vu constante... Deixe-me ir, preciso andar. Vou por aí a procurar, rir pra não chorar... Não há desolação em mim. Há angústia de uma espera misteriosa que move meus dias; esse gosto pelo inusitado que nem sempre se configura mas ainda assim me enche diariamente de uma alegria sem peso, que aparentemente não é nada, e me inunda todo. Sim. Devo orar a Deus para que sempre me conceda Esperança. Porque do Nada eu construo um império inteiro de felicidades possíveis, mesmo que a eventual Desilusão do amanhã me ceife os caminhos percorridos. Sendo imaterial, a Esperança me devolverá do mesmo Nada os sonhos necessários ao prumo da felicidade.


Tenho me proibido entristecer, não obstante me surpreendam lágrimas tímidas que derramam o excesso dessa solidão escolhida... Se alguém por mim perguntar, diga que eu só vou voltar quando eu me encontrar... O sol já se anuncia Rei. Respondo para Cartola que voltarei sem me encontrar, porque imagino que a gente sempre esteja nessa procura faminta, de respostas insistentemente inexatas. Quero assistir ao sol nascer, ver as águas dos rios correr, ouvir os pássaros cantar. Eu quero nascer, quero viver...


Dobro a última esquina antes de refazer o percurso de casa. É meu caminho diário. Minha alma se pinta diante do ipê roxo florido que até ontem era um verde comum e imperceptível na paisagem. Meu sorriso se abre mais. Ele agora tem o peso do sol. Peço a Deus que eu também possa ser essa Primavera. Amém.


Ipê florido de Guajará Mirim - fotografia feita por mim



Hérlon Fernandes Gomes



Guajará Mirim, Rondônia, 17 de agosto de 2010.




P.S.: Para minha amiga Fernanda Ferreira Britto Rêgo, que tem compartilhado seu banzo comigo. Para você, com tudo o que há de mais sublime no universo.


sábado, 3 de julho de 2010

Brainstorm II


A nebulosa... Adentro essa penumbra de sentimentos e imagens inesperados. (Pequena pausa) Saudades repetidas, desejos... A vida é mesmo essa repetição medíocre? Pecado achar a vida medíocre? Só estando meio amargo para enxergar tudo em preto e branco... Consigo identificar através do nevoeiro um velho tocando seu realejo... Tenho sonhado comigo quando criança; é uma situação estranha, como se outra vida me pertencesse nesse passado. Mais açúcar no café, senhor? Não, obrigado. Meu café precisa ser mesmo amargo. Há cajueiros floridos por aqui que me transportam para lugares ansiados. Às vezes esqueço das imensidões das distâncias, enquanto me obrigo a substituir o café pela camomila. Trouxe aquele LP de Ednardo que tem Manga Rosa e Lagoa de Aluá e também algumas fitas de Chico Buarque e Nara Leão. São portais para lugares já conhecidos tão meus. Não me atrevo a convidar ninguém a dividir esse som comigo, só tenho encontrado viventes de galáxias surdas... Há borboletas e plantas exóticas que me prometem sonhos felizes e me cochicham para que eu não enlouqueça, advertem-me de que a saudade boa jamais enlouqueceu alguém; no máximo, uma angina na alma.
Estou em desordem escrita. As palavras se me negam. As coisas necessárias e urgentes surgem quando não posso escrever. Acho que abri a caixa de Pandora e também não deixei que a Esperança escapasse. É lua cheia. É noite clara. Eu uivo na mesma sintonia dos cães.

Hérlon Fernandes Gomes
Guajará Mirim - RO, 03 de julho de 2010.

P.S.: Este não é para entender mesmo. É um simples exercício para me consolar desse infeliz período de vacas magras. Às vezes tenho a triste sensação de que não há mais nada que valha a pena ser escrito. Tomara que passe logo! O Arqueologia é meu terapeuta!

domingo, 6 de junho de 2010

Brejo Santo de Luto

A sociedade brejossantense está enlutada. Meu coração é negro e pesado de silêncio. A nossa cultura perde uma das personalidades mais importantes da nossa comunidade. Recebi há pouco a triste notícia de que Marineusa Santana falecera em Brejo Santo.
Conheci Dona Marineusa no início da década deste século, quando do lançamento do seu REMINISCÊNCIAS, obra paradigmática para a produção bibliográfica em nossa cidade. Digo isso porque depois da publicação dessa obra, parece que um gosto mais apurado por nossa história e nossa cultura foi resgatado e isso impulsionou para que muitas outras obras aparecessem.
Pois bem, adquiri o livro sem conhecer a autora pessoalmente, apenas de nome ou por "ouvir dizer". Qual foi a sorte de nos unir na idealização do Memorial Padre Pedro Inácio Ribeiro, no ano de 2003. Nossos laços se estreitaram muito e pude compartilhar com intimidade daquela memória e personalidade invejáveis.
Dona Marineusa escrevia sem pretensões. Detentora de um estilo livre e leve como o memorialístico, contando lembranças familiares, delineava nossa história cultural nas deliciosas entrelinhas de sua prosa. Acompanhei a publicação de A ESCALADA DO TEMPO, seguida do MEU UNIVERSO EM VERSO, tive o prazer de ver de perto o germinar destas obras. Dividimos muitas expectativas, desejos e questões sobre a cultura universal, sobre a cultura de nossa gente.
Dona Marineusa foi um ser humano muito espirituoso, de mente sagaz, humilde e também ferina na sua verve satírica, pois não tinha papas na língua para expressar sua verdade - isto lhe conferia sua autenticidade e, por muitas vezes, também lhe emprestava um quê de impertinente para com os ignorantes. Sua obra inteira foi patrocinada pelo suor de seu trabalho, temperada pelo seu profundo amor à escrita. É bem verdade que, escrevendo um estilo memorialístico, sua obra se importava muito com as coisas pessoais; mas isso de forma alguma desmerece sua totalidade. Seu amor pela história de sua gente era um ótimo pretexto para desencantar nossa história e nossa cultura e devemos a ela essa linha inaugural na literatura brejossantense no estilo memorialístico. Tive o prazer por acompanhá-la muitas vezes na arqueologia da descoberta da nossa história, visitando cartórios, sacristias, documentos familiares, tudo em busca de dados fidedignos na construção do que, para ela, era um ócio criativo.
Visitei-lhe quando de seu retorno de São Paulo. Fatídico retorno de um pesado tratamento de saúde. Reservada, como sempre, fugia do sensacionalismo que envolvia sua doença. Estavam ela e sua filha Neusinha. Fui oferecer-lhe um exemplar do meu GEMINIANOS, já que impossibilitada esteve para a noite de lançamento. Encontrei uma Marineusa mais enigmática, silenciosa, com um olhar meio distante. Parecia intimamente querer compreender tudo aquilo que lhe passava. Tinha fé, como sempre teve; mas não era mais a Marineusa menina que acompanhava os desfiles do Cabeção no raiar do dia, no Bar Kanal; não era a Marineusa a segurar no meu braço e me antecipar novidades do seu próximo trabalho; não era a Marineusa guerreira a lutar contra moinhos de ventos na luta útil em elevar nossa cultura. Durante todo o pesar de sua doença, comunicávamo-nos sempre pela internet, visitando seu site, trocando recados pela página de relacionamentos...
Estou reticente por constatar que ela partiu. Mas não me sinto em dívida por não ter depositado flores sobre seu caixão neste momento de despedida; porque ela já estava preparada para o outro mundo, para a verdadeira vida. Ela sabia e sentia a transitoriedade desta passagem e certamente agora vibra por reencontrar todos os seus, eternizados em suas memórias, nos álbuns de retratos que ela tornou públicos e que nos legou um resgate ímpar da nossa história.
Meus sinceros votos de pesar ao Sr. Raimundo, Roberto, Rosângela, Rogério, Neusinha e netos.

Hérlon Fernandes Gomes
Guajará Mirim - RO, 06 de junho de 2010.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Não desertei!

A inspiração fugiu de mim... Passo um tempo inútil diante do computador, mas nada quer ser escrito, ou nada se sente valer a pena por se revelar. Sinto-me meio morto, impotente e inútil. Estou meio insosso. Gostaria de compartilhar com quem me lê que finalizei o LÚMEN ou DE CORPO E ALMA (Poemas Profundos). Acho que me esgoto um pouco quando ponho um ponto final num trabalho que sinto como acabado. Acho que estou me "desacostumando" dessas emoções passadas, já concebidas. Mas passo por aqui para dizer que não desertei! Que tenho espremido minha mente e minha alma em busca de novas nuances - mas parece que passo por um momento necessário de hibernação. Às vezes dura menos do que eu imagino - e eu sinceramente desejo que demore muito pouco!
Um até breve!

Hérlon Fernandes Gomes




Deixo para vocês este vídeo com imagens de Tom Jobim e Elis Regina e a música INÚTIL PAISAGEM, uma música que tem resumido um bocado do que sinto.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

POEMA A MANUEL BANDEIRA


POEMA A MANUEL BANDEIRA



Queria ser o doce


No fim do fel que se dissolve


Na ponta da minha língua,


No fim do nosso beijo.


A música aos poucos me devolve a calma


E eu passo a sonhar...


Como antigamente.


A saudade sempre me consola


E dela eu extraio lembranças boas


— O combustível necessário para seguir em frente.


Procuro a felicidade pelos cantos:


Às vezes, uma pálida luz que se esconde;


Noutras, um perfume adocicado a fugir


Entre becos, nos cajueiros virgens da praia.


Espero o sono.


Ele me traz sonhos encomendados


Em que sou amigo do rei


E amante de qualquer mulher,


Na cama que escolherei.


Hérlon Fernandes Gomes


 
(Do inédito LÚMEN, ou DE CORPO E ALMA, Poemas Profundos)

domingo, 18 de abril de 2010

Crônica de saudades


De repente um nó engasgador na garganta. Uma angústia que é fruto de muito amor deixado longe. Acho que agora posso sentir um pouco do significado do banzo, que matou tantos escravos de saudades - arrancados à força de sua terra natal. Comigo a realidade não é triste, é outra; mas a saudade que sinto de casa não deixa de doer, não deixa de incomodar; embora ela também seja combustível para que eu edifique as promessas que me reservei, seja a intensidade da luz que tenho pedido a Deus para me servir de farol.
Em minha casa eu conheço a direção dos ventos e sei identificar facilmente o Norte e o Sul. Em minha casa existe a cumplicidade muda de todos os cômodos, o reconhecimento de todos os cheiros e gostos: desde o café da manhã até o cheiro verde do jardim regado. Guardo em minha mente um álbum de retratos vivos, em que meu pai joga cartas todas as noites, minha mãe embainha minhas calças na máquina de costura e eu converso com meus irmãos no alpendre... Essas coisas são o que me fazem ser pessoa e me dão significado e significância perante a Existência; são essas coisas que eu tenho como mais primitivas e puras.
Aqui, eu me sinto como uma árvore grande, arrancada de uma terra distante, que precisa de tempo para que suas raízes se acostumem ao novo solo. Minhas folhas estão amarelecidas de saudade; mas meus frutos futuros terão o gosto desse lugar que me viu crescer; minha seiva será iluminada pelos sonhos do sopé do Cariri, pelo afeto que está guardado e vivo nesse lugar que é meu lar perpétuo.

Hérlon Fernandes Gomes

P.S.: Para meus familiares e amigos que estão distantes apenas geograficamente.

terça-feira, 16 de março de 2010

Expressão do inexprimível


Dizer que gostei do teu gosto é pouco... Dizer que gostaria de me demorar mais sobre teu peito poderia soar como uma receita pronta e barata de um falso conquistador... Então eu calei e esperei que esse meu silêncio fosse capaz de dizer bem mais da minha verdade, das coisas que não preciso elaborar para dizer, porque estão prontas e se manifestam no entrelaçamento de nós dois.
Não, eu não te peço que me decifres. Quero que me sintas. E que as sensações captadas por tua alma deixem teu dia mais feliz, roubem-te um sorriso à toa em qualquer momento da tua rotina cotidiana. Não, não tenho a pretensão de ser perpétuo na vida de ninguém, porque até mesmo o amor perpétuo tem um quê de prisão. Quero amar a liberdade de te querer e não ser dono de verdades absolutas em relação a nós dois. Nós precisamos de razão para nos amar? 
Não quero falar de medos, nem gosto de pensar neles... Tenho esquecido das coisas ruins que possam nos desolar, nos afastar. Estou mais paciente ultimamente, de tal maneira que dificilmente qualquer ganho ou perda será capaz de causar grandes mudanças no meu coração. Já amamos demais... Já sofremos demais... Sei que nossas cicatrizes não podem nem devem servir de desculpas para a entrega de uma tentativa de felicidade.
É, talvez eu tenha muito a dizer ou talvez precise escutar muito mais... Tens o gosto do incrível e da surpresa em tua essência. Isso me deixa desarmado e ao mesmo tempo livre para passear por esse desconhecido caminho de alegrias. Preciso esperar mais de nós? Eu espero. Mas tenho deixado que essa esperança ganhe a vitalidade da renovação das manhãs ou se espalhe pelo mundo dizendo que em algum momento dois olhares foram capazes de se embriagar de um desejo sublime e feliz.
Agora, o que me importa verdadeiramente é a saudade dos nossos beijos e como me sinto bestificadamente feliz simplesmente porque sei que tu vives.

Hérlon Fernandes Gomes
Brejo Santo - CE
16 de março de 2010

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

CÂNTICO DE LOUVOR À ESPERANÇA




CÂNTICO DE LOUVOR À ESPERANÇA


Esperança, eu te deixo que me abrace e me embale,

Eu te deixo que me cante tua canção de ninar

E me encha de sonhos felizes.

Esperança, eu vou adormecer nos teus braços

E me encher das promessas que tua presença encerra.

Deus se compadecerá dos meus delírios pueris

E não me negará a doçura dos meus desejos,

Porque eu sacramento minha vida diante da Luz,

Meu banho nesta nascente é um batismo de pureza.

Esperança, eu te peço que me habite sempre,

Seja o verniz da minha alma

Para que eu entoe cânticos de felicidade em teu nome,

Porque, sem ti, o Espírito agoniza em coma.

***
Esperança, eu te deixo que me abrace e me embale,

Eu te deixo que me cante tua canção de ninar

E me encha de sonhos felizes.

Sempre.


Hérlon Fernandes Gomes

08 de fevereiro de 2010


P.S.: Para minha amiga Marineusa Santana, dedico este poema de Luz. Que a Esperança, que é irmã gêmea da Fé, esteja sempre ao seu lado! 

P.S.2: Infelizmente não sei quem é o autor de tão bela gravura. Gostaria de creditar o nome do seu criador. Quem souber, por favor, faça-o nos comentários.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

A VIAGEM




A VIAGEM




Os marmeleiros exalam seu perfume verde pelo Ar,

Há uma brisa a esfriar de conforto minha alma,

O Universo é todo o céu que se me emoldura.




Quem suspenderá os astros para que o Céu não caia?

Quem comandará a engenharia do Tempo para que Ele nunca se atrase?

O Inverno estende seu véu de noiva - colorido de Esperança.




Quem terá a aquarela do céu, nos azuis do Dia e da Noite?

Quem ordenará à Lua para que inicie seu reinado?

As volúpias parecem ser mais ardentes cobertas de luar...




Quem despertará a Terra para que nasça em flores?

Onde morará o perfumista da Primavera?

A vida deve ser guiada pelo Sonho, pelo Amor, pela Paz...




Quem ainda terá os olhos da Alma?

Quem ainda verá o Sagrado nas coisas mais simples?

O Crepúsculo é um diamante do Mar de Deus a luzir sem vaidade...




Hérlon Fernandes Gomes

04 de fevereiro de 2010




P.S.: Para quem possui os Olhos da Alma.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

MINICONTO APAIXONADO





          Talvez fosse tempo mesmo para ele se encantar novamente – em tempos atrás talvez chamasse isso de se iludir.
          Agora ele sentia que era tempo para se entregar à deriva de uma paixão que fosse a cor dos seus dias. Cansou de se bastar (alguém se basta?); cansou de acreditar que conseguia reger a intensidade dos próprios sentimentos como a uma orquestra. Precisava voltar a sentir saudades, a ser também essa ânsia para alguém.
          Ele lembrava de toda a calmaria que o enchia todo dessa alegria esquecida."É meio como andar de bicicleta”, pensou. Era tão bom esquecer as horas de tédio com a plenitude da presença dela... Passou a sentir vontades adormecidas depois que suas salivas se misturaram. O tempo havia se calado naquela hora. E ainda assim, calados, quanto disseram de si mesmos, quanto se tornaram cúmplices nos desejos?
          Não havia palavras nem conceitos que pudessem ser falados ou escritos, porque poderiam soar ridicularmente. Mas acontecia nele um fenômeno que só podia ser um sinal: seu suor exalava a mesma fragrância do cheiro dela, numa perseguição onde ele era o próprio rastro.
          A cama estava mais fria com apenas um corpo nu. Demorou-se com a insônia, perpetuando na imaginação os beijos de agora há pouco — lembranças tão vivas e mornas. 
          Sentia-se mais vivo, sentia-se iluminado.

Hérlon Fernandes Gomes
Madrugada de 28 de janeiro de 2010. 

Fotografia do filme ASAS DO DESEJO (Der Himmel ünder Berlin), de Win Wenders, um clássico do cinema, de 1987.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

PEREGRINA CANSADA



Estava tão cansada para pensar nessas sensações... O sono lhe pesava nas pálpebras, mas ela permaneceria insone pela ausência daquele homem sem nome e rosto. Ele agora era apenas esse pensamento desejado, essa procura que ela se esforçava por empreender, embora já se sentisse sem forças.
Ela queria rasgar esse amofinamento que pesava em toda sua superfície, queria se embriagar de luz, mas seus passos se automatizavam para esse recolhimento de monotonia. Nem se reconhecia mais... Perdia a fé? Perder a fé é o mesmo que perder a esperança... O que seria dela então? Por que não se acostumar com o que já possuía? Por que outros perfumes não mais lhe seduziam? Estava cansada de insistir nessa mesma fragrância. Continuava a ouvir as mesmas canções – “só durante este outono” - , como uma prece desiludida...
Lembrou-se de um tempo em que os sonhos fracassados não a desolavam tanto. Já não era mais infância. Agora estava tão só... Tão só e reticente, porque não conseguia ter o freio para a correria inconsequente do coração. “Meu Deus, me castre essas emoções que não se plenificam...”. Isso soava como uma batida fúnebre da qual tentava fugir rapidamente. Gostava da vida, nascera para a vida, no entanto aparentava carcomida pelos cupins e traças da desilusão. Tinha vergonha desse melodrama que se tornava. Era preciso sorrir; mas seu sorriso nascia como a exigência automática diante de um flash numa fotografia com as amigas.
Sentia-se tão cansada por essa peregrinação... tão cansada por entregar seus olhares a ermo, em busca de um desconhecido, de alguém que preenchesse um enorme vazio deixado e suprisse as súplicas que suas esperanças exigiam...
Ele não era alguém de contornos precisos, não tinha um rosto definido, porque os ideais daquela mulher só poderiam ser rabiscados no plano da alma. Ele era um desenho que não foi feito para enxergar, mas para sentir.
Perambulava pelas noites, em todos os bares, esquinas... Era uma cega que não reconhecia o gosto do amado em tantos lábios beijados, em tantos carinhos fugazes... O amor estava em crise?
Continuava a ouvir somente o ruído dos próprios passos sobre o asfalto ainda quente. Nada tinha cara de companhia, nada tinha sabor de música – tudo era apenas silêncio.
Aguardaria que essa presença secreta e desejada a encontrasse. Cansou-se de ser peregrina, cansou-se de encher seu coração com planos vãos, com desejos que não se compartilhavam. Perfumou-se mais uma vez para si e foi dormir um sono sem sonhos.
(Nem desconfiava que Deus preparava uma primavera silenciosa em seu nome.)

Hérlon Fernandes Gomes
Brejo Santo – Ce

Desenho de Renato Fernandes Feitosa.
Juazeiro do Norte - CE