quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O ÚLTIMO DITADOR



General, para quê um coração se és todo razão?

Na tua estátua de aço fundido está a imagem de tua alma metálica,

Cheia de botões e brochuras de vaidade

Perfilada pelos que te temiam, não pelos que te admiravam.

Teus discursos só ecoaram no teu presente,

Porque o futuro  te renegou nos corações dos jovens,

Cheios do sangue vivo de liberdade.

General, teus joguetes foram planos precários

Como as placas das ruas que levam teu nome

Mas permaneceram conhecidas pelas alcunhas dadas pelo povo:

Rua da Luz, Beco da Esperança, Alameda dos Desvalidos...

Não percebias que a história contada por teus escribas era esclerosada

E que os seixos da estrada brilhariam para sempre as vozes lúcidas do passado?

General, a alma do homem é inalienável.

Podias convocar teu exército de mercenários,

Exigir verdades inventadas;

Podias chamar de bem a ignomínia que realizavas;

Mas não tiveste o poder de despertar a primavera!

Amaldiçoado estás pela cegueira eterna

De onde só enxergavas o vil metal.

Condenado estás a não sentir

Pois incapaz foste de acalentar-te pelo amor de um filho.

***

General, já nem lembram teu nome

 - Tua placa fora arrancada!

Estás ao relento, sob sol e chuva,

À mercê dos pombos, que não respeitam tua patente.


Hérlon Fernandes Gomes

Guajará-Mirim, Rondônia, 22 de Setembro de 2011 - Madrugada.


segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A felicidade breve é também felicidade



O que eu tinha feito com aquele desejo guardado e empoeirado? Percebi que ele não estava tão escamoteado ou irrecuperável quando bati os olhos novamente em ti.

O tempo nos uniu novamente sem que para isso precisássemos de esforços. Agora, nada poderia criar barreiras entre esses desejos impublicáveis do passado. Teu coração já não tinha mais dono. Éramos agora nós, um diante do outro, com tão pouco tempo para compensar esse passado de hibernação.

E foi tanto medo de que essa ânsia só me pertencesse. Enfrentei os teus olhos porque já não éramos ilegais. Agora era tão bom não ter de fugir deles; era tão bom sondar teus pensamentos, imaginá-los como pares dos meus desejos.

A noite foi longa até restarmos apenas nós dois e a manhã batizando o nosso primeiro beijo. Fecho os olhos por alguns segundos para poder captar esse momento: meus dedos entre teus cabelos, o gosto bom da tua boca, os nossos desejos nos queimando...

Lulu Santos nos mandava “nos permitir” e assentíamos para essa oportunidade que se nos oferecia. E, calmo, olhava para ti, simplesmente por olhar para compartilhar meu sorriso mais verdadeiro ao teu lado.

Na cama, nem imaginava que éramos tão íntimos, que conhecerias tão bem os caminhos do meu tesão absoluto, que te entregarias a mim como alguém que eu conhecesse os mistérios mais sublimes de comunhão.

E vimos estrelas. E conversamos. E não veio o sono.

Foram três dias de saciedade de uma sede enorme. Eu bem queria poder te beber todos os dias... Mas respeito o encanto da Cinderela e aceito voltar para o borralho, onde eternidade é apenas essa saudade palpável que sinto de nós dois, ao brinde de vinho, beijos,  Maria Bethânia e nossos corpos elaborando a alquimia da paixão.

Volto para casa feliz. Nada de desilusão, nada de desalento, nada de esperanças que me façam sofrer. Foi desejo liberto o que vivemos. Eu me banhei de luz em ti, eu me senti vivo nos teus braços, na hipnose maciça dos teus olhos castanhos.

Culpa? A culpa maior seria ter rejeitado essa oportunidade que a Vida nos pôs de bandeja. Escrevo isso para eternizar, para que o futuro mais na frente não queira me enganar e dizer que tudo não passou de um sonho.

A felicidade breve é também felicidade. Ela não perde a plenitude quando nos assoma como a rapidez de uma estrela cadente.

Hérlon Fernandes Gomes
Guajará-Mirim, Rondônia, 05 de Setembro de 2011.

P.S.: Entrei Setembro no Cariri contaminado de primavera.